A trajetória de Antonio Carlos Pipponzi e da RD Saúde se confundem com o desenvolvimento do varejo farmacêutico no Brasil. O avô dele, o italiano João Baptista Raia, chegou ao País em 1895 e, em 1905, fundou sua primeira pharmacia, ainda com “ph”, em Araraquara, no interior de São Paulo. A empresa se reinventou várias vezes desde então, sempre sob o comando da família.
A segunda geração foi liderada por Arturo Pipponzi, pai de Antonio Carlos, e a terceira, pelo próprio executivo – que atua até hoje como presidente do Conselho de istração e foi fundamental na transição do negócio para a quarta geração da família.
Antonio Carlos Pipponzi detalha os desafios, erros e acertos dessa jornada, que inclui ainda a fusão com a Drogasil, em 2011, no recém-lançado “Transitando entre gerações – A história centenária de uma pharmacia que se transformou na maior rede farmacêutica da América Latina” (Citadel Grupo Editorial).
Ele contou à reportagem da Mercado&Consumo mais sobre a publicação e o dilema de se lidar com um grande legado e um olhar constante para a inovação ao mesmo tempo. Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.
Mercado&Consumo: Como uma empresa centenária, familiar, com uma cultura muito bem pavimentada, abre espaço para a inovação e transformação constantes?
Antonio Carlos Pipponzi: Empresas familiares são muito potentes. Prova disso é que 75% do PIB mundial vêm de empresas que são de origem familiar. O grande desafio está exatamente nas transições de gerações. Você tem sucesso, quando, em primeiro lugar, olha para trás e respeita o legado anterior. Em momentos de transição, é muito normal que uma parte da família queira continuar o legado e a outra parte queira realizar uma liquidez. Isso é uma coisa mais do que justa e razoável, mas o alinhamento se torna mais difícil. Por isso é muito importante que a empresa tenha lideranças que consigam equilibrar esses momentos. E mantenham valores como empatia, equilíbrio, reconhecer o problema dos outros, não ter vaidade. Outro ponto importante é trazer inovação. Existe um conceito que hoje já é mais falado, que é o da ambidestria. É um grande desafio: a manutenção do legado de um lado e a inovação do outro lado. Você pensa: essa empresa chegou até aqui desse jeito e não há dúvida de que é um case de sucesso. Mas será que o que a trouxe até aqui é o que vai levá-la adiante?
No nosso caso, tínhamos 120 farmácias quando a terceira geração saiu do negócio. As coisas andavam muito bem, a gente era a segunda do mercado e provavelmente seria a primeira. Os jovens que entraram eram muito bem-preparados e tinham a visão de inovação muito acurada. Concluíram faculdades de primeira linha, foram trabalhar em consultorias fora da empresa, foram fazer MBA fora do País. Eles trouxeram um arsenal estratégico fantástico.
Mas como é que uma empresa vive quatro gerações? Quando você recebe um legado, você tem que respeitar aquele legado, entender como se chegou até lá e ao mesmo tempo entender que o que vai te levar para o futuro não é exatamente o que te trouxe até aquele momento. E aí você se encontra com esse dilema: de um lado, manter o legado; do outro lado, inovar e transformar. Você tem que fazer as duas coisas. Quando você desequilibra a balança, que é a falta de ambidestria, você realmente incorre em erros. Você pode ficar no mesmo lugar e se tornar uma empresa velha, desatualizada e que vai morrendo, ou pode correr o risco de ter um crise de liquidez, como nós tivemos, por ceder diante das inovações. Tudo o que esses jovens nos trouxeram, tudo fazia sentido. Só que o problema era conjugar e fazer tudo na hora certa para que não se corressem grandes riscos, não se sacrificasse a liquidez como a gente sacrificou. A gente prejudicou o legado. Mas lógico que a gente aprende com isso.
“Existe um conceito que hoje já é mais falado, que é o da ambidestria. É um grande desafio: a manutenção do legado de um lado e a inovação do outro lado. Você pensa: essa empresa chegou até aqui desse jeito e não há dúvida de que é um case de sucesso. Mas será que o que a trouxe até aqui é o que vai levá-la adiante" crossorigin="anonymous">